Uma piada do destino...
Em agosto de 1987 o navio panamenho Solana Star estava em
águas brasileiras com um carregamento de 22 toneladas de maconha que havia sido
carregada em Cingapura e seria levada aos Estados Unidos, passando pelo Rio de
Janeiro e transferida para embarcações menores.
Os tripulantes, suspeitando do monitoramento do navio pela
agencia de combate as drogas dos Estados Unidos – DEA despejaram no mar,
próximo à Angra dos Reis, a carga em torno de 15 mil latas, recheadas de
maconha com mel. Dias depois, as latas emergiam nas praias do Rio de Janeiro,
São Paulo, Espírito Santo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
A Polícia Federal brasileira só chegou ao navio em setembro,
quando já estava ancorado no Rio de Janeiro e da tripulação só restava o
cozinheiro, que foi preso, condenado a 20 anos de prisão e extraditado um ano
depois.
A partir da aparição das latas, várias histórias começaram a
ser contadas, músicas foram compostas, livros foram escritos, filmes e vídeos
estão na internet com depoimentos hilários sobre o episódio.
Nos livros NOITES TROPICAIS E VALE TUDO, Nelson Motta conta
que na época era raridade encontrar a droga no Rio de Janeiro e diz que “o
milagre aconteceu”. A qualidade da droga era muito superior à distribuída por
aqui, e a expressão “é da lata” se tornou sinônimo de coisa boa.
Na biografia de Tim Maia, Nelson conta que o cantor ordenou
ao seu secretário que comprasse todas as latas que pudesse, porém ele só
conseguiu três latas.
Conta-se que uma socialite carioca, numa festa em São Paulo,
teceu elogios à qualidade da erva e solicitou a melhoria no padrão do produto
oferecido pelo tráfico carioca.
O roqueiro Serguei conta que viu vários ônibus lotados de
surfistas em Saquarema. A galera voltava prá casa com a prancha debaixo de um
braço e uma lata debaixo do outro. Era muita gente e muita lata, conta o
roqueiro que garante não ter fumado nada.
Um caseiro de Monsuaba, próximo a Angra dos Reis, escondeu
em casa cerca de 300 latas, Foi preso e processado.
Em janeiro de 1988 aconteceu o Hollywood Rock, onde se
apresentaram The Pretenders, Simple Minds, Duran Duran, Simply Red, Supertramps
e UB40, além dos brasileiros Lulu Santos, Marina, Titãs, Paralamas do Sucesso e
Ultraje a Rigor. O vocalista do UB40, Astro, subiu ao palco carregando uma lata
e falou num portugês enrolado “muito jererê prá vocês”.
Moraes Moreira também posou com uma lata na capa do disco
República da Música, lançado em 1988. Até Roberto Carlos compôs no mesmo ano a
música “Tô chutando lata”.
No disco Psicoacústica do Ira, gravado em 1988, considerado
um disco ousado e visionário para a época e tido como um dos melhores discos da
história do rock brasileiro, não houve música de trabalho, pois segundo o
vocalista Nasi, eles estavam usando muito o produto da lata.
O poeta Chacal escreveu o poema “A Lata” (da lata/sai o
gênio da fumaça/que do mar veio para a areia) que foi recitado no disco “Da
Lata”, de Fernanda Abreu, em 1995.
O bloco carnavalesco Suvaco do Cristo desfilou em 1988, com
um samba composto por Lenine e Bráulio Tavares que dizia na letra “a lata que
vem do mar/é presente de Iemanjá/prá esse ano que inicia”.
No filme O DIABO A QUATRO, de 2004, o ator Jonathan
Haagensen, vencedor do prêmio de melhor ator coadjuvante no Festival de
Brasília, vive um traficante carioca às voltas com as latas surgidas na praia.
Wanderley Rebello Filho conta no livro 1988 O VERÃO DAS
LATAS DE MACONHA a história e todo o procedimento do julgamento de Stephen Shelkon,
o cozinheiro do Solana Star.
A jornalista Scarlett Moon fez um mapeamento do Rio de
Janeiro, especialmente do Posto 9, e conta histórias, inclusive a da lata, no
livro AREIAS ESCALDANTES.
Em 2005, o professor da PUC-SP e psicanalista Oscar
Cesarotto lançou o livro VERÃO DA LATA, criado a partir da ficção em torno do
acontecimento.
Claudio Manoel, um dos cassetas e autor do documentário
Ninguém sabe o duro que dei, pretende fazer um documentário em torno da
historia das latas e comenta que “além de aparecer em grande quantidade,
devidamente enlatada e do nada, a danada não era só da boa, era da ótima!”
Em janeiro de 2013, o diretor Tocha Alves pretende lançar o
documentário que também terá o nome de Verão da Lata, já em fase final de
filmagem.
O diretor e roteirista João Falcão também pretendia filmar o
Verão da Lata, mas como já existem 03 projetos em andamento, ele deseja criar
uma série para a televisão.
No próximo dia 31 de julho, terá o lançamento do livro VERÃO
DA LATA do jornalista Wilson Aquino, que se dispôs a recontar a história das
latas.
A polícia federal recuperou 2563 latas, 20 ou 30% do que foi
lançada ao mar.
O resto? Virou fumaça...
Publicado no jornal O DEBATE RIO DAS OSTRAS em 27/07/2012
Esse é o texto integral da coluna, o texto publicado foi condensado.